11.5.06

Eu: perdendo o "pique"

Desde o diagnóstico de meu pai, em 25/09/05, até umas duas semanas atrás, sempre estive a "todo vapor". Dormia 4 ou 5 horas por noite e conseguia no dia seguinte cumprir com meus afazer habituais, além de dedicar umas 4 horas diárias à pesquisa de alternativas terapêuticas para bater o nosso Golias (o Glioblastoma Multiforme). O fato de descobrir que o uso de várias de nossas substâncias (licopeno, selênio, melatonina e alfad) poderia ser comprometedor da eficácia do temodal (o quimioterápico), mesmo não sendo isto uma verdade conclusiva e ser alvo de controvérsia na comunidade científica, teve um impacto monumental sobre as minhas convicções até então. Estas se baseavam em conseguir um conjunto de substâncias que pudessem isoladamente contribuir um pouco para o tratamento, que apresentassem baixos risco, e que juntas, se tudo desse certo, poderiam agir em sinergia, aquela historia onde 1+1 pode ser muito mais que dois.


Acho que cansei, ou melhor, que estou cansado. Nesses últimos dias tem sido um esforço monumental fazer quase qualquer coisa. Sejam elas relacionadas às nossas pesquisas ou às minhas atividades habituais, andei perdendo peso sem estar fazendo regime, tenho dormido mal e ficado indisposto durante o dia, tenho uma gastrite que vem e vai, e estou muito anti-social. Como minha formação básica é de Psicólogo, embora nunca tenha trabalhado como tal, sei que estes eventos podem muito bem ser sintomas de Depressão ou distimia, que são muito fáceis de ocorrer em situações traumáticas, não só com a vitima da doença, mas também com aqueles que as querem muito bem. No artigo sobre as fases do doente terminal, em que menciono os relatos de estudos da Doutora Elisabeth Kubbler Ross, há várias descrições de comportamentos tipificadores das citadas fases que tenho percebido em mim mesmo.

De tudo o que está acontecendo acho que três coisas me incomodam mais:

1. A minha incapacidade para fazer tudo que seria possível e importante para o êxito do tratamento;

2. O estado atual de meu pai, que não é muito pior do que aquele em que ele saiu da cirurgia, mas que representa um tênue espectro do Grande Homem que ele era um dia antes do diagnóstico. Apesar de biologicamente ele estar dentro das expectativas, sei que ele sofre profundamente com suas incapacidade e limitações atuais e isto me afeta visceralmente;

3. A necessidade de encarar firmemente o problema da finitude, algo com o que temos enorme probabilidade de ter que tratar.


Sei que ao construir o blog diário de um tumor cerebral forneci esperanças para muitas pessoas que visitam anonimamente (2155 acessos no mês passado) e para vária outras que mantém contado comigo via e-mail ou nas Comunidades do Orkut e acho que isto torna minha carga ainda mais pesada. Carga esta que não sei por quando tempo agüentarei.


Nunca reclamei do que ocorreu. Desde o início sempre tive claras para mim as obrigações que tenho para com meu pai. Sei que possuo uma grande dívida para com ele, seja ela filial, fraternal ou simplesmente humana. Por isso, diariamente o que peço a Deus não é uma carga menor, mas sim ombros mais fortes para poder carregar a carga que me foi destinada.


Em algum local deste blog, mencionei que sou um sujeito, que, quando convicto de algo, é essencialmente teimoso e não desiste. Que lutaria até o ultimo tiro da última batalha da guerra. Mas hoje sei com clareza que preciso de ajuda e apelo a todos os que se consideram meus amigos e que souberem me ajudar, que o façam. Que me ajudem a lutar a luta que ainda tenho pela frente e que, quando ela acabar, o que provavelmente acontecerá com derrota, eu pelo menos consiga manter a dignidade por ter feito tudo o que estava ao meu alcance.

Agradeço a todos.

6 Comments:

At 18:50, Anonymous Anônimo said...

Miguel:
Deus nao da fardo mais pesado do que surportamos, nao se esqueca disto -nao ha nada de errado com seus ombros, sao fortes o suficiente.
Se escrevo aqui e' porque vivo o mesmo drama existencial que vc (minha mae, 58 anos GBM). Nao considere que perdera a batalha, nao considere como vitoria a cura ou a derrota do GBM. Considere como vitoria a superacao do corpo, ou seja, a preservacao do espirito, da alma, das lembrancas daqueles a quem tanto amamos e admiramos. O fato de estar ao lado do seu pai neste momento, de estar presente, de buscar alternativas ja mostra a vitoria do amor que vc tem por ele. Mostra que vc reconhece o que ele fez, e para ele, para seu pai, mostra que seu dever de pai, de exemplo a ser seguido foi muito bem cumprido ja que tem um filho que tanto o ama. Procure estabelecer agora com o seu pai lacos que ultrapassem o GBM, lacos estes que sem duvida ficarao no coracao do seu pai.
Um forte abraco,
Daniela

 
At 23:22, Anonymous Anônimo said...

Miguel,
Não desista...Estamos passando por uma situação parecida com a sua ( Minha sobrinha que tem apenas 7 anos, tem glioma no tronco ). Sei que é dificil, mas temos que ter forças para dar força a quem precisa...E o seu pai precisa de vc..
É o que tenho feito para ajudar a minha irmã.. E pedir a Deus que nos ajude cada dia mais, pois só nele que a gente pode encontrar conforto...Tenha fé e lembre-se: Deus sabe o que faz.
Um abraço
Tahis

 
At 22:15, Anonymous Anônimo said...

Miguel, me chamo Sandra. Descobri recentemente um tu benigno, provavelmente um meningioma (mas ninguém tem certeza). Estou na fase da luta por uma boa equipe médica, lí muito sobre o assunto, é assustador. Me deparei com vc meio sem querer, li suas anotações e alguns comentários dos seus amigos. Deu pra perceber o quanto vc é íntegro e bom e imagino o orgulho que seu pai deva ter, isso é o melhor pagamento de uma vida, saber que vc passou os melhores valores para uma criatura e ela se tornou alguém especial...Ainda vai sofrer muito em virtude da certa partida de seu querido pai, mas se dê esse direito, chore, grite se quiser, mas sofra...A dor se tornará física, talvez te falte ar, respire fundo, isso tudo vai passar se vc se der o direito de sofrer, depois vc sentirá uma saudade linda e tênue, mas sentirá conforto, tenha certeza. Quando menina perdi uma pessoa de quem gostava muito, por isso sei a dor e a julgar pela sua linda relação com seu pai, sei que sua dor será monumental. Mas sei que você será muito mais forte para a vida!!
Um abraço carinhoso, de uma amiga anônima, que hoje está num momento ruim!! Um beijo para aquecer seu coração!!

 
At 10:30, Anonymous Anônimo said...

Miguel,
É compreensivel o que está ocorrendo com você, mas este blog é muito importante para quem foi diagnosticado de tumoração cerebral e também, tenho certeza, que SERÁ para os futuros diagnosticados. Tenha certeza que todo seu tempo empregado aqui tem muito valor. Sinceramente é uma das mais valiosas páginas na Internet em português sobre este assunto.
Não canso de te dar parabéns!
Um grande abraço, muita paz!

 
At 17:03, Anonymous Anônimo said...

Miguel,você é professor da UFBA?

 
At 11:43, Blogger Unknown said...

bom dia...
também passo por uma situação semelhante, meu pai teve um tumor no pulmão, foi operado, e ficou bem durante 2 anos, no meio do ano passado foi diagnosticado um novo tumor cerebral "oligodengroglioma" metastático, com várias calcificações, foi operado com sucesso e sem sequelas, mas agora 7 meses após, voltou a ficar muito mal com os mesmos sintomas pós operatórios, submetido a nova ressonância, foi detectado nova lesão expansiva e novos focos de tumor, nova metástase, os médicos descartam cirurgia e analisam a possibilidade de fazer quimoterapia. A situação é difícil, imagino que posso perder meu pai a qualquer momento, não é fácil, eu entendo o que você está passando.

 

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